Friday, September 29, 2006

quanto anos mesmo de perdão ?

completamente falso o entendimento de que há uma superpopulação de bandidos na cadeia. a superpopulação anda cá fora.

Sunday, September 24, 2006

palavras do senhor marquês

…. que vejo eu no deus deste culto infame senão um ser inconsequente e bárbaro, que hoje cria um mundo de cuja construção amanhã se arrepende ? que vejo eu nele senão um ser fraco, incapaz de fazer o homem dobrar-se para o lado que ele quer ? esta criatura, apesar da vinda dele, domina-o; pode ofendê-lo e por isso merecer suplícios eternos! que ser tão fraco é esse deus! então ele pôde criar tudo o que vemos e lhe é impossível formar um homem conforme a sua vontade ? mas, responder-me-eis, se o tivesse criado assim, o homem não teria mérito? que coisa insípida! que necessidade há que o homem tenha mérito diante de deus? se o tivesse formado totalmente bom, aquele jamais poderia praticar o mal e só então é que seria obra digna de deus. deixar ao homem a escolha é tentá-lo. ora, deus, pela sua presciência infinita sabia bem o que daí ia resultar. a partir desse momento, é portanto por prazer que condena à perdição a própria criatura que formou. que deus horrível, esse! que monstro, que celerado, tão digno do nosso ódio e da nossa implacável vingança! todavia, mal contente com tão sublime ação, afoga o homem para depois o converter: fá-lo arder, amaldiçoa-o. nada disto o modifica.


sade, in a filosofia na alcova ou os preceptores morais, nos anos 80, em edição da gama.

Friday, September 22, 2006

manuel bandeira

Estou farto do lirismo comedido
Do lirismo bem comportado
Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente
protocolo e manifestações de apreço ao sr. diretor
Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicionário o cunho vernáculo de um vocábulo
Abaixo os puristas
Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais
Todas as construções sobretudo as sintaxes de exceção
Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis
Estou farto do lirismo namorador
Político
Raquítico
Sifilítico
De todo lirismo que capitula ao que quer que seja fora de si mesmo
De resto não é lirismo
Será contabilidade tabela de co-senos secretário do amante exemplar com cem modelos de cartas e as diferentes maneiras de agradar às mulheres etc.
Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbedos
O lirismo difícil e pungente dos bêbedos
O lirismo dos clowns de Shakespeare
Não quero mais saber do lirismo que não é libertação

(viagem ao âmago da palavra)

Wednesday, September 13, 2006

eu como o sou

palavras, elas foram feitas muito mais pra esconder do que pra revelar.

na terra dos maus-caracteres

“ o que convencionamos chamar de “bom caráter” , no brasil, é o homem anódico, quase sempre sem gosto literário ou artistico, que não griga, não tem opiniões próprias, não toma responsabilidades, sorri gravemente, cumprimenta com austeridade, procura ganhar a vida sem aborrecer os ourtros, logrando na aparente doçura irritar o menos possível, não suscitar reação, seguindo os caminhos abertos pelos outros, ou ficando no seu canto, com boa cara e postura sossegada. lutou, perdeu o caráter”.

gilberto amado in a chave de salomão e outros escritos

Monday, September 11, 2006

jesus é fiel ?

o amigo nunca é fiel. só o inimigo não trai nunca. o inimigo vai cuspir na cova da gente. nélson rodrigues.

Thursday, September 07, 2006

carunchos e tatus cósmicos

As coisas impossíveis chamam como sinos de algum ponto da eternidade.
Ressonam em meus ouvidos como símbolo de esperança de que as alcance.

Quando você chegou, a humanidade existia há alguns milhões de anos. O mundo já estava carunchado, todo cheio de buracos. É difícil admitir, mas os carunchos somos nós.

Acreditamos que somos uma “raça cósmica”, viemos de outro planeta, e talvez por que não nos sentirmos comprometidos com a Terra é que a perfuramos, raspamos sua superfície, poluímos os ares, esburacando a esfera feito tatus em busca de ouro, dólares e felicidade. Mais que carunchos, somos grandes tatus cósmicos. As marcas de nossa sabedoria obtusa já se tornaram visíveis. Devastamos os continentes, matamos os bichos, cortamos e queimamos as árvores e agora despejamos todo o lodo de nossa civilização nos oceanos. Somos a espécie mais cruel, sanguinária e apavorada que já pisou este asteróide singelo, e em nome deste pavor estamos nos preparando para lhe dar fim. Depois de acabarmos com tudo aqui, fugiremos numa grande nave espacial, guiada por um sujeito chamado Búfalo Bush, o novo Noé!!

Somos essa mistura atômica, essa massa batida de poeira estelar, esses biscoitos andantes, fazedores de totens, adoradores do Ausente, engenheiros do absurdo, arquitetos do futuro, compositores do gozo e da dor. Somos capazes de levantar monumentos ao que haja de mais terno e singelo, como também podemos nos fazer em pedra e massacrar nossa própria espécie, como você verá nos documentários sobre as guerras e nos jornais de todo dia.

Mas apesar de todas as asneiras que cometemos, estamos aqui, com esse sentimento de que é preciso continuar vivendo.

Alguns de nossos semelhantes costumam encarar a vida como “algo” controlado por forças divinas, de entidades invisíveis, de mundos fora do nosso. Para eles, os deuses são criaturas mudas e intocáveis, cheias de bondade e sabedoria, mas também dotadas de poder e de sentimento de vingança. Outros acreditam que a vida foi gerada por forças titânicas, misteriosas, mas palpáveis, que um dia serão reveladas e controladas pelo ser humano.

O que realmente seja, ou o que venha a ser a vida, tem pouca importância. O que interessa é aquilo que pensamos que somos, ou o que pensamos que sejam as coisas em nosso redor, e não o que elas sejam de fato. As pessoas mais educadas compreendem que a vida será sempre inexplicável. Aliás, a inexistência da vida, que se manifesta numa pedra jogada à beira da estrada, isso também é inexplicável. E o correr dos anos nos mostra que a pedra morta também está viva!

Levaremos pelo menos três milhões de anos até chegar a uma conclusão razoável do que seja isto, estar aqui, existindo, e isso é a eternidade.

Partimos em busca de comida porque as horas passam, nossos organismos consomem o que comemos, e já é hora de consumir novamente. Fazemos aniversário porque o girar dos astros gera as horas, o tempo anda, os anos correm, e no fim da corrida está o fim da vida. O que significa este “fim”, ninguém conseguiu dizer. Até agora, só conseguimos nomeá-lo!

Pretendemos fugir da morte indo ao encontro da vida, mas elas andam juntas, e num ponto distante se tocam. O caminho é o tempo, que se mostra sob o aspecto de “espaço” e de outras milhares de formas. Cada fato atrela-se a um segundo, um dia, uma década. Cada obra está sempre contida numa unidade de tempo, nestes casulos temporais onde vivemos, onde se formam borboletas e carunchos de todos os gêneros.

A humanidade é feita de tantos segmentos diferentes quantas são as espécies de insetos que habitam o planeta. Em cada quadra da cidade encontramos uma forma diferente de julgar, de amar, de andar e de estremecer. Filósofos e ditadores tentaram dar à humanidade um formato sólido, de comportamento previsível, e todos falharam. Nossa espécie é vaporosa, feito água que volatiliza na superfície dos lagos, que sobe e se adensa, formando grossas e maduras nuvens, que dia menos dia caem sobre a terra em forma de mansa garoa ou furiosa tempestade. O gênero humano é como um oceano, que forma outros oceanos, num ciclo infinito, cada vez mais volumoso, cada dia mais rico de histórias.

A cada um de nós foi dado um jeito de perceber a passagem do tempo. Para mim, os anos parecem estradas que se perdem no horizonte, avançando em movimentos parabólicos. As décadas instauram o turbilhão das cidades, geram tempestades no deserto, volumosas massas que descambam pelas encostas das montanhas, formando grandes rios e lagos.

A vida fora do homem está isenta das horas, por isso é quieta, serena e absoluta. A vida externa ao pensamento humano espalha-se como uma brisa silenciosa, criando e destruindo mundos. O que vive além do homem é imenso, estupendo, um gigantesco conjunto de criaturas e estruturas que parecem saber muito bem de si, mas que permanecem indiferentes ao labor e às mesquinharias humanas.

O universo das palavras encerra-se num universo próximo.
Para além dele, o silêncio dá todas as instruções.

Você passará muitas horas pensando na finitude da vida. Ficará atormentada ao descobrir que num determinado momento o fluxo será interrompido. Terá noites insones, pensando num meio de fugir a esse destino, mas todas as vezes deparará com a interrupção inevitável. Após anos de revolta, finalmente compreenderá que a vida individual é finita porque de outro modo a “vida” seria impossível. A cada dia, cada ano, a Natureza e a cultura humana irão trazendo para você o conhecimento de que a imortalidade seria uma coisa não somente absurda, mas patética e dolorosa.

Se as flores fossem eternas,
teriam as pétalas duras e cobertas de mofo.
A beleza das flores pertence à sua fluidez.

Num tempo infinito, nossos desejos perderiam todo significado, já que poderíamos saciá-los quando nos desse na veneta. Para a maioria de nós, o sabor que colhemos está sempre vinculado à sua urgência. Aliás, todas as atividades humanas (economia, política, arte, religião, etc) foram se desenvolvendo com um olho na vida, outro na morte. Se os homens não fossem mortais, as regras seriam completamente diferentes. É muito provável que não haveria regras! O sentimento de posse só faz sentido se você sabe que não terá tempo para adquirir, no futuro, o que está desejando agora. A competição entre humanos resulta do medo das sombras, onde o tempo reduziu-se ao máximo, onde a vida já não se pode expandir.

A vida imortal somente seria possível se aceitássemos a transformação da nossa consciência num outro tipo de consciência, ou noutra forma de vida, capaz de desejar o mundo com novos sentidos. Mas ninguém quer perder-se de si mesmo, embora tenhamos de passar necessariamente por esse ponto.

Por outro lado, a descoberta da vida mortal é tremendamente doída. Estar aqui para depois não estar! Isso é injusto, cruel, mas verdadeiro. A existência é o decreto de seu próprio extermínio.

A humanidade precisa tirar as vendas, e olhar, mesmo que lhe inspire terror, a escuridão e a geleira do cosmo. E mergulhada no negro profundo, enxergar com os olhos bem abertos esta vasta esfera, este imenso organismo vivo e vibrante, onde tudo acontece e de onde toda consciência foi gerada.

A Natureza mostrou-me, através dos sonhos, que a minha morte faz parte da receita, como um ingrediente essencial à confecção do bolo. Também me apresentou parte da solução do enigma que envolve a vida e a morte, mostrando como a consciência precisa desintegrar-se para ser sobrevivente.

Os livros me apontaram a imortalidade como o maior castigo que um homem poderia receber. Viver mais de cem anos com a forma humana significaria vagar sobre a Terra feito condenado, sem objetivo, sem desejos, sem destino. Algo como um braço amortecido, quando acordamos de manhã. Ele não somente não pode mover-se ou sentir qualquer coisa, como na verdade não quer. Está morto, estando vivo.

Haverá um momento em que deixarei esta vida, mas a vida, estranhamente, continuará. Você estará aqui, fazendo suas coisas, buscando seus prazeres, sanando suas dúvidas. E haverá um momento em que você também partirá, deixando para trás todos os seus sonhos, esperanças, alegrias. Em que instante isso se dará? Em que circunstâncias? Eu gostaria de saber, mas também sei que esse conhecimento seria insuportável. Qualquer um de nós que soubesse o exato momento de sua morte, teria uma vida terrível. É a ignorância que nos permite viver, lutar e amar.

Acredito na vida, e sei muito bem colher a minha seiva. Mas passei uma certa fronteira inevitável, onde a percepção da morte torna-se um assunto pessoal inadiável. Estou impregnado dela, como também estou cheio de vida.

A cada dia cresce entre os estudiosos a consciência de que vivemos num vasto campo de maravilhas, de pequenos milagres verdadeiros e palpáveis. Temos cinco sentidos para descobrir o mundo, e possuímos uma mente gelatinosa, capaz de nos levar a outros mundos, onde as maravilhas e os sentidos são outros. Nascemos envolvidos numa abóbada azul, formada pelo oxigênio que entra em nossos corpos, que nos alimenta e nos faz vivos. Saboreamos os frutos, que nos dão o sabor e a saciedade, e são eles que nos mantêm em pé. Produzimos música e são os nossos próprios ouvidos que a desfrutam. Fabricamos perfumes para nosso próprio deleite.

Nossos semelhantes costumam falar de um mitológico “maná”, que descia dos céus nos tempos bíblicos, que alimentava a humanidade, e por ele ainda suspiram. Sentem-se mergulhados na desgraça, abandonados por Deus, que nos tempos antigos fazia tantos milagres! Não percebem que o maná continua caindo, em forma de raios solares, de gotas brilhantes que molham a Terra. Tampouco compreendem que o maná está debaixo de seus pés. Basta soltar as sementes e regá-las, e em poucos dias o maná se transforma numas coisas extraordinárias chamadas ervas, arbustos, morangos, milho, leitões!

Quando passa a infância, as pessoas costumam perder sua capacidade de deslumbramento. Não conseguem admirar-se por nada, senão por sua incrível capacidade de ganhar dinheiro, de causar ciúmes, de fazer jogos, onde disputam, esquartejam-se e matam-se. A vida então se torna cinzenta, cruel, azeda e besta.

crônica de chico guil, no diário da jade, publicada na carta capital on line.

Sunday, September 03, 2006

castro, mas não fidel

"ao crítico que existe em você – e que você insiste em enjaular naquela esperança de que talvez o ser humano saiba o que faz.
pois, olhe, pode acreditar numa coisa: ele não sabe".

Saturday, September 02, 2006

dialética

“criar uma nova cultura não significa apenas fazer individualmente, descobertas”originais”; significa, também, e sobretudo, difundir criticamente verdades já descobertas, “socializá-las”, transformá-las, portanto em base de ações vitais, em elemento de coordenação e de ordem intelectual e moral. o fato de que o povo seja conduzido a pensar coerentemente e de maneira unitária a realidade presente é um fato “filosófico” bem mais importante do que a descoberta, por parte de um “ gênio filosófico”, de uma nova verdade que permaneça patrimônio de pequenos grupos intelectuais.” gramsci.